O luto é um péssimo roteirista

Olá, pessoas que insistem em ler as coisas que escrevo. Como vão vocês? Por aqui, as coisas andam tranquilas. Admito que meus remédios estão me ajudando bastante a dar uma estabilizada no meu humor, nos meus pensamentos e nas minhas paranoias, porém acredito que ainda estou vivenciando o chamado luto. Sabe, aquela coisa que você sente quando uma pessoa querida vai embora desse mundo.

Nas primeiras semanas, foi bem difícil. Passei muito tempo na cama, sem forças pra fazer muita coisa, mas com o tempo fui melhorando. Atualmente, me sinto bem a maior parte do dia — vez ou outra, vem uma lembrança triste e eu acabo chorando, mas na maior parte do tempo, estou bem, lembro das coisas boas e sinto-me grata por ter tido a oportunidade de compartilhar 25 anos da minha vida com a minha mãe.

No fundo, acho que estou lidando bem com o luto. Porém, apenas acho. Durante a noite, meus sonhos parecem querer me dizer o contrário. Eu vivo sonhando que estou chorando, que está tudo acontecendo de novo, que estou passando por toda essa dor de novo... É péssimo. Contudo, há um detalhe muito interessante: o luto é um péssimo roteirista.

Meus sonhos geralmente começam tudo bem, nada demais acontecendo. De repente, em alguma cena, minha mãe aparece. E, depois, a notícia: ela voltou à vida! Ou ela foi ressuscitada de uma forma mágica, ou os médicos cometeram um erro ao declarar seu falecimento, e de repente ela está em pé e andando novamente, tudo certo.

E como se isso não fosse o suficiente, surge também uma ótima notícia: os médicos erraram o diagnóstico, então ela não tinha câncer terminal! Ela nunca teve um glioblastoma multiforme, todos os médicos erraram, todos os exames deram falsos positivos! E agora teríamos que iniciar todo o processo diagnóstico novamente pra ver o que ela realmente tinha — eis a parte pesada do sonho, no qual, mesmo sem o câncer, ela ainda estava doente e possivelmente correndo um grande risco de vida. A dor, então, se repetia.

Eu acordo tendo que rir dessa piada. É óbvio que, nestes sonhos, o mecanismo de negação está em plena ação. Para quem não sabe, o luto tem diversos estágios, e o primeiro deles é a negação: você se recusa a acreditar na perda, ou começa a tentar se convencer de que a perda não é tão dolorosa assim, que está tudo bem, que vai ficar tudo bem. Infelizmente, não é verdade.

Enquanto acordada, eu pareço estar em um estágio mais avançado do luto — com momentos de aceitação ao sentir gratidão por ter tido minha mãe em minha vida, felicidade por ter acompanhado parte da existência dela etc. —, durante o sono eu ainda estou presa no primeiro estágio. Eternamente em negação.

Não sei se isso quer dizer alguma coisa. Talvez as datas festivas tenham servido de combustível pra essa negação toda — afinal, passar essas datas sem ela foi bem pesado, não posso negar. O fato é que talvez seja assim mesmo, talvez eu sempre vá ter momentos de negação, outros de aceitação, ou até mesmo momentos de barganha, por que não? A questão, de fato, não é até quando este luto irá durar, mas sim que... Caraca, podia escrever uns roteiros melhores pros meus sonhos, hein?